A arca, o deus da nossa conveniência

segunda-feira, janeiro 23, 2012

I SAMUEL 4.1-5.
Ora, saiu Israel à batalha contra os filisteus, e acampou-se perto de Ebenézer; e os filisteus se acamparam junto a Afeque.
E os filisteus se dispuseram em ordem de batalha contra Israel; e, travada a peleja, Israel foi ferido diante dos filisteus, que mataram no campo cerca de quatro mil homens do exército.
Quando o povo voltou ao arraial, disseram os anciãos de Israel: Por que nos feriu o Senhor hoje diante dos filisteus? Tragamos para nós de Siló a arca do pacto do Senhor, para que ela venha para o meio de nós, e nos livre da mão de nossos inimigos.
 Enviou, pois, o povo a Siló, e trouxeram de lá a arca do pacto do Senhor dos exércitos, que se assenta sobre os querubins; e os dois filhos de Eli, Hofni e Finéias, estavam ali com a arca do pacto de Deus.
Quando a arca do pacto do Senhor chegou ao arraial, prorrompeu todo o Israel em grandes gritos, de modo que a terra vibrou.

Esse texto não poderia ser mais atual. Ele nos fala de uma realidade que estamos muito acostumados nos dias de hoje no meio evangélico.
É a teologia dos símbolos, dos atos proféticos, dos objetos sagrados nos cultos e nas praticas de fé.
Deus instituiu a arca, e o fez no deserto, numa terra seca, inóspita quente e fria. Lá o culto precisava de representações visíveis, palpáveis, concretas para que pedagogicamente pudesse educar, instruir moldar o caráter do povo.

 A arca era símbolo da presença de Deus no meio do povo. Diz-nos o texto de números que deus descia sobre a tampa do propiciatório no santo dos santos para falar com Moisés ou Arão.
“E porás o propiciatório em cima da arca; e dentro da arca porás o testemunho que eu te darei. E ali virei a ti, e de cima do propiciatório, do meio dos dois querubins que estão sobre a arca do testemunho, falarei contigo a respeito de tudo o que eu te ordenar no tocante aos filhos de Israel”. (Ex.25.21,22).
Note que a arca fazia um conjunto com o propiciatório e Deus descia ali, sobre o propiciatório, que era como se fosse uma tampa, com dois querubins sobre ela.
A importância da arca estava na presença real, gloriosa de Deus que descia sobre ela dentro do lugar santíssimo. A arca sem a presença de deus seria uma caixa, como outra qualquer.
Foi assim com o templo, que uma vez glorioso, tanto em riqueza material quanto em riqueza espiritual foi destruído pela mão de Deus através dos babilônicos, quando o povo se afastou dele.
A arca passou a ser vista como uma espécie de talismã, de figa, de amuleto da sorte; quando as coisas ficavam ruins, o povo lançava mão dela para se proteger ou vencer suas guerras.
Até ai, eu não disse nada, por que Deus se colocava mesmo a disposição do povo para ser acionado na hora da dor, na hora do aperto. O problema é que os hebreus viviam distantes de Deus em todo o tempo em que havia paz: pecavam com pecados sexuais, praticavam injustiça e a mentira, adoravam ídolos, e outros pecados mais. Mas, quando o dia mau chegava, eles recorriam a arca, como se nada tivesse acontecido.
Nesse sentido, a arca passou a ser um amuleto da sorte de gente sem caráter, sem dignidade, sem respeito por si mesmo e por Deus.

O problema de se praticar uma fé assim, presa a objetos, a símbolos é que se transfere a Fo para o objeto, e o objeto não fala, não ouve, não confronta, não aponta o erro.
E isso é tudo o que se quer; não ter que dar satisfação nem a deus nem a ninguém dos atos dos sentimentos e pensamentos que se vivencia na existência.
Para os hebreus ter a arca como deus sem deus, era muito cômodo, confortável, pois a arca sem deus não falava, não censurava, não confrontava.
Essa arca sem Deus era facilmente manipulada, movida de um lado para o outro, sempre conduzida a bel prazer dos homens. Tanto é que quem a levou para o campo de batalha naquele dia negro da historia de Israel, foram Hofini e Fineias, os dois sacerdotes prostitutos filhos de Eli que foram rejeitados por Deus.
Neste texto, Deus já tinha saído da arca a muito tempo. Ele só vai voltar a descer sobre a tampa do propiciatório, pasmem vocês, na terra dos filisteus, para destruir a Dagom e sua marra, e para dar uma lição aos filisteus com as hemorróidas.
Se a vida é sínica, mascarada, hipócrita, travestida de santidade e sendo por baixo sepulcros cheios de ossos podres, então não adiante se esconder a traz dos símbolos: vidro de azeite, copo com água, monte, jejum, lenço ungido, o vinho ou suco de uva da santa ceia, frases de efeito pentecostal, declarações positivas de fé, versículos isolados usados como arma contra o mal, bíblia aberta no salmo 91, os dons, a posição eclesiástica,  os atos proféticos, a filiação evangélica, e outros bichos. Nós estaremos sozinhos como os hebreus estiveram naquele dia, à arca foi com eles, mas sem Deus.

O que me choca é fato de eles de fato acreditarem que Deus estava com eles, que Deus era com eles naquele dia. Eles tinham essa certeza, pelo simples fato de trazerem a arca junto com eles. Eles perderam o primeiro combate, e isso por si só, já deveria ser motivo para saberem que Deus não estava com eles, que alguma coisa estava errada.
Na mente deles e na nossa, é mais fácil usar um Deus que não fala, não pensa, não interage, não censura, ou confronta – a arca - do que se arrepender, acertar a vida com Deus, colocar a vida sobre o altar de Deus, trazer o coração para perto de Jesus.
Ouve naquele dia uma manifestação tão poderosa que estremeceu a terra, mas não foi nada sobrenatural, não foi o Espírito Santo de Deus, foi só homem, carne, emoção, desejo desesperado de que acresça deles estivesse certa. Às vezes por quere muito uma coisa, acabamos por produzir respostas espirituais, manifestações carismáticas, supostas falas de Deus.
O fato de que todo aquele estremecer de terra era só carne, era só homem, foi a derrota que eles sofreram no final, as mortes, as perdas, e a arca, o deus conveniente deles foi seqüestrado.
Melhor que a arca é Jesus. Ele é a tampa do propiciatório onde Deus desce para conversar conosco o tempo todo.
E Jesus não quer para nós uma fé fingida, vazia, mascarada, dividida, sínica, que se apega aos símbolos da religião quando as coisas apertam. Jesus nos quer com ele em toda a vida, por amor, com simplicidade, com sinceridade, com verdade.

Que Deus nos guarde em Cristo, amem.

Marcio Oliveira

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